E para 2016? A opinião de Vasco da Câmara Pereira

E_para_2016Esta é de facto a pergunta de um milhão de dólares: e para 2016? Como deverá a RTP escolher a nossa representante?

Muito se tem escrito sobre o assunto e muitas fórmulas têm sido tentadas pela RTP ao longo dos anos: umas mais acertadas e outras completamente ao lado. Talvez não exista uma receita de sucesso, mas há com certeza que ter noção daquilo em que somos bons e únicos, levando-nos a surgir nos palcos europeus com algo completamente diferente e que nos destacará dos restantes concorrentes.

Se a opção for um Festival, sou da opinião que devemos dar primazia aos compositores portugueses (sejam anónimos, sejam escolhidos pela RTP). No entanto, acho que os responsáveis pelo concurso deverão ter perfeita noção do que pretendem e, caso nenhuma proposta apresente os parâmetros requeridos, não as aceitar e eliminá-las categoricamente. A RTP nunca se deverá contentar com canções que não apresentem qualidade suficiente para pisar os palcos eurovisivos e representar a nossa cultura e a nossa musicalidade.

É óbvio que se deve optar por compositores portugueses, mas se não apresentarem canções condignas, então deverá convidar-se compositores estrangeiros, que conheçam a fundo a cultura portuguesa e que entendam o que se pretende: dignificar Portugal, a sua música e os seus intérpretes.

E falando em intérpretes, também me parece que ficaríamos melhor representados por alguém com dados firmados no panorama musical. Não nos esqueçamos da enormidade que é este festival europeu e da gigantesca responsabilidade que o cantor tem sobre os ombros, devendo brilhar e destacar-se em apenas 3 minutos. Por isso, acredito que um feito destes estará sempre melhor salvaguardado por um artista consagrado, do que por alguém recém chegado. Mas, há sempre exceções à regra: veja-se por exemplo a Dora (em 1986) ou a Sofia Vitória (em 2004), completamente inexperientes, que defenderam fabulosamente as suas canções no ESC.

Mais importante que os compositores e os intérpretes é, no fundo, o tipo de canção que devemos selecionar. Não somos fortes no pop ou no rock, sendo muito difícil competir com “monstros” como a Suécia ou a Rússia, que apostam forte nestas valências musicais e que não deixam o sucesso em mãos alheias. Então, considero que a nossa aposta deverá residir em algo em que somos únicos. Por que não experimentar um fado?

Quando falo num fado, refiro-me a algo tradicional e não uma amostra dessa valência musical. Há aquelas vozes que dizem que já levámos fado à Eurovisão e que não fomos bem sucedidos. Eu pergunto, quando? Em 1987? Em 2012? Lamento, mas nenhuma dessas canções é um fado. São temas ligeiros, acompanhados à guitarra portuguesa e apenas com uma base inspiratória fadista.

Então por que não levar um verdadeiro fado? Pelo menos veríamos qual a reação da Europa. Poderia até ser muito boa: canções pouco comuns como “Birds” (Holanda 2013) e “Suus” (Albânia 2012) tiveram enorme sucesso na Eurovisão, o que nos poderia também acontecer com um fado mais ou menos tradicional.

Iria adorar ver a Ana Moura na Eurovisão com um fado corrido no género do “Desfado” ou mais choroso como “Amor afoito” – tenho a certeza que ficaríamos muitíssimo bem representados.

Também sou um defensor acérrimo da língua nacional. Não vejo que esse seja verdadeiramente o problema subjacente e até dou alguns exemplos: “Grande amore” (Itália 2015), “Nije ljubav stavr” (Sérvia 2012), “Suus” (Albânia 2012), “Molitva” (Sérvia 2007), entre outras – todas canções que não foram cantadas em inglês e que alcançaram o top 5 final. Se a canção for boa, se for magistralmente interpretada e se a apresentação for de excelência, não é pelo poema não ser inglês que a canção não vingará.

Fala-se muito que quase todas as canções que ganham o ESC hoje em dia são cantadas em inglês. Mas também podemos dizer que o mesmo acontece com as canções que ficam em último lugar ou que terminam com 0 pontos.

Quanto ao método de votação, que também é o tema do dia na Eurovisão, julgo que não há receitas infalíveis. Creio que seria bastante justo que fosse possível uma mistura de televoto (a abrir apenas no final da apresentação de todas as canções), júri distrital, especializado e internacional. Pelo menos, teríamos a opinião de todos, o que permitiria provavelmente ir mais ao encontro do gosto europeu.

Resumindo, parece-me a mim que não há uma receita melhor que a outra. Mas é sem dúvida preferível dar primazia ao profissionalismo e à nossa cultura musical.

Artigo de opinião de Vasco da Câmara Pereira – Professor de Matemática e de Biologia, Comentador no site Festivais da Canção

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.